28 de abril de 2011

As crises

Estamos tão prisioneiros de nós próprios do nosso pequeno mundo de derrapagem financeira económica e heresia política que o Mundo começa cada vez a passar-nos mais ao lado. Assim cada vez sabemos menos a situação concreta do perigo nuclear do Japão, do seu luto, da sua recuperação face à enorme catástrofe sofrida. E seria bom sabermos mais sobre este drama tão maior que o nosso pequeno quotidiano e saber mais sobre a cultura deste povo e o seu modo de reagir perante a realidade e de superar o pessimismo que como povo de há muito alimentamos. 
Na verdade pergunto, mas Portugal alguma vez esteve bem em termos económicos? E não me respondam que várias vezes as Finanças Públicas estiveram equilibradas ou no monte de ouro arrecadado por Salazar porque o povo vivia na miséria. Porque o bem estar económico de um país não pode medir-se apenas pelo estado das Finanças Públicas, mas também pelo seu nível de quantidade e qualidade de produção, pelo índice de exportação face à importação, pelos números do desemprego, pelo valor dos salários, pensões e subsídios ou melhor pela qualidade real da vida do seu povo...
É verdade que o comércio de escravos e bens das Colónias permitiu encher alguns bolsos e até uma Embaixada ao Papa... Mas o povo, todo o povo português, usufruiu disso? Não.
Esta crise começou há muito, há vários anos que a vivi no Tribunal de Trabalho do Porto, com o encerramento e despedimento no comércio tradicional, nas pequenas indústrias, oficinas etc. Que a nossa crise teve a contribuição da crise nos outros países também me parece evidente. Que os nossos políticos, governo e oposição, nunca a encararam na sua real dimensão e consequências também para mim é evidente, tal como ainda não vi nenhum dos candidatos a eleitos apresentar um rol de propostas concretas, imediatas e médio prazo, com consequências naqueles que mais auferem ( quer seja vencimentos, lucros ou pensões ) e na economia ilícita e paralela também é verdade. Insultos contínuos e imputações da responsabilidade ouço todos os dias. Todos os dias não, porque desligo até já conheço a conjugação das frases...
Algo que me surpreende e me preocupa é que também não oiço os mais novos formular propostas, ouço humor, músicas e letras sem qualidade, reivindicações... Em vez de "Geração à Rasca" preferia uma geração com garra e ideias, prática e com visão de futuro. Reivindicar o fim dos Recibos Verdes e da precaridade do trabalho é o mesmo que reivindicar pelo direito ao trabalho continuado e não temporário, questão velha que também se colocou a todas as gerações anteriores. Uns emigraram, outros trabalharam a prazo e em coisas que detestavam... eu, por exemplo, ao licenciar-me não consegui qualquer emprego a não ser vender encicolpédias de porta a porta à comissão de toda a gente já estava farta que lhe tentassem impingir... Tive que optar por um estágio profissional e exames numa área que não era aquela com que sonhara e depois tive que mudar de lugar de trabalho várias vezes pelo país acima e adentro... Ou seja, para quem vive do seu trabalho apenas e não tem os padrinhos certos a subsistência nunca foi fácil.
Agora existem diferenças entre os dias de hoje e o 25 de Abril: hoje há menos ideias e ideais, há menos pensamento colectivo, há menos seriedade e convicção na actuação...
O momento histórico é outro e longe de mim defender que o modo de pensar e de agir deverá ser o mesmo!
Só que apenas a alguns cidadãos de meia idade e mais velhos, afastados da acção política, economistas sociológos empresários, ouço analisar com profundidade e apresentando mesmo algumas soluções. È que o FMI até nos pode obrigar a pôr as Finanças Públicas em ordem, cortando ainda mais nos salários, os subsídios e pensões da classe média, mas não nos resolve o problema da nossa economia, da pobreza extrema, do emprego, da segurança no emprego ( pelo contrário ) nem da qualidade de vida dos portugueses - essas são questões reais que nós próprios teremos que encarar e para as quais são precisas ideias, propostas, acções ou seja cidadãos novos e políticos novos ( e não novos apenas na idade!).
Mas a questão de que queria falar nem era esta, mas lá me resvalou a palavra para aquilo que também a mim, de modo igualmente comezinho me preocupa constantemente...
Queria falar da Síria, da Líbia, o Yémen, do Afeganistão... do quanto as pessoas continuam a manifestar-se e a morrer sob a tirania e cada vez temos menos notícias... Já não é notícia relevante porque nós próprios já nem nos interessamos. Tunísia e Egipto que foram os primeiros e culturalmente mais próximos ainda suscitaram manchetes e posicionamentos no Facebook e manifestações de solidariedade. Agora já nos habituamos a que se indignem e morram, já não é novidade nem é nada connosco... Importante mesmo é saber quem vestiu quem para a festa X, o casamento do neto de Isabel II, o castigo do jogador e o penalti em que não houve penalti  para não exemplificar com assuntos ainda menores.

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